Nascido em Brasília de Minas e radicado em Montes Claros, o artista e professor Osmar Pereira Oliva apresenta, até o dia 13 de junho, no Centro Cultural Hermes de Paula, a exposição “Recortes e fragmentos de memórias”, em que aborda o sertão, a ancestralidade e a condição feminina. Além de artista, Oliva é professor com formação em Letras pela Unimontes e doutorado em Estudos Literários pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
 
A sua exposição traz uma diversidade de técnicas, mas há um predomínio das colagens com papéis, tecidos e metais reciclados. O que te levou a escolher esses materiais e como eles dialogam com a ideia de memória?
As obras apresentam principalmente a técnica de colagem, mas também levam um toque do bordado em algumas delas. O aspecto das memórias está presente na reciclagem de revistas antigas e de outros materiais reutilizados, como metais e tecidos. Mas também se refere às influências recebidas de outros artistas, como Van Gogh, Tarsila do Amaral, Konstantin Cristoff, dentre outros.

Você se refere às obras como “recortes e fragmentos de memórias”. Pode nos contar mais sobre que memórias são essas? Elas são pessoais, coletivas ou ambas?
Os fragmentos de memórias tanto são pessoais como coletivos, pois as influências de outros artistas visuais estão no imaginário universal. As leituras literárias também são compartilhadas com todos os espectadores, como o texto bíblico, por exemplo.
 
A representação feminina está bastante presente, especialmente mulheres negras, como uma forma de denunciar silenciamentos e opressões. Como você escolheu abordar essa temática e o que deseja provocar no público com essas imagens?
Venho de uma família em que a opressão feminina sempre esteve presente. Experienciei isso desde a infância, e vem desde a minha avó paterna, que precisou separar-se do marido carregando um filho de apenas dois anos para libertar-se da opressão e da violência. Esse histórico se repetiu ao longo da nossa história; as mulheres pretas, ainda que não seja o caso da minha família, também sofrem esses abusos, talvez mais do que as mulheres brancas. Por isso faço a denúncia, para que nenhuma mulher aceite ou se cale frente à opressão e à violência.
 
Sua trajetória como bordadeiro é bastante conhecida. Como o bordado continua presente na sua prática atual, mesmo que de maneira menos visível?
Sou um artista múltiplo, pois trabalho com fotografia, pintura, escultura, colagem e bordado. Há 5 anos, com o falecimento da minha mãe, ei a me dedicar quase exclusivamente ao bordado; então, em todas as outras expressões artísticas que desenvolvo, estou inserindo o bordado. Gostaria muito de ser lembrado como Osmar Oliva bordadeiro.
 
O uso de materiais reciclados tem uma dimensão estética, mas também política. Como você enxerga essa escolha no contexto social e ambiental em que vivemos? 
Eu venho de uma família muito tradicional, mas meus pais eram pobres e convivemos com restos, reciclagens, sobras, reutilizações. Desde a infância eu via minha família refazendo coisas. Hoje, com a minha formação universitária e como artista visual, julgo importante politizar o uso consciente de recursos naturais e o reaproveitamento de objetos e materiais que são descartados. Meu olhar se aguçou para tudo que está no despejo, então vou catando o que pode ser usado em minhas obras: madeira, metais, tecidos, folhas secas, sementes. Então vejo os resultados: um objeto artístico bonito, que foi reaproveitado.
 
Para além da técnica, o que você acredita que une todas as obras dessa exposição? Qual é o fio que costura esses “recortes e fragmentos”?
Mesmo que as obras apresentem temas diversos, como o sertão (aves e flora), a condição da mulher em nossa sociedade, a colagem como técnica é o fio condutor de todas elas, e a memória, as lembranças que tento expressar sobre as coisas que vivi, minhas leituras literárias, meus artistas visuais preferidos.